sábado, 2 de outubro de 2010
Comunicado da ESTC e Carta Aberta do Projecto Embaixada do Teatro Brasileiro
COMUNICADO
O Conselho Directivo da Escola Superior de Teatro e Cinema comunica que os espectáculos “3 Cigarros e a Última Lasanha” e “Dentro”, da Embaixada do Teatro Brasileiro, programados para hoje, dia 1 de Outubro, foram cancelados devido a questões que transcendem o regular funcionamento da Escola Superior de Teatro e Cinema.
Quaisquer esclarecimentos serão prestados pela BackGround, produtora do evento.
CARTA ABERTA DO PROJECTO EMBAIXADA DO TEATRO BRASILEIRO
Amigos portugueses, quem v...os escreve é a equipe do projeto EMBAIXADA DO TEATRO BRASILEIRO. Esperamos que vocês não confundam nossas opiniões sobre a ESTC com o que pensamos e sentimos por Portugal. É exatamente pela irmandade que sentimos pelos portugueses que decidimos acabar publicamente com uma farsa de mau gosto instaurada no ventre da referida escola.
Esta carta segue para artistas, jornalistas, estudantes, universidades, embaixadas, ministérios de cultura e educação de Brasil e Portugal e para quem mais achemos que deva seguir, pois ao contrário do teatro de onde fomos banidos, o espaço virtual é livre e não pode sofrer censura da ESTC. Pedimos àqueles que concordem ou discordem de nosso ponto de vista que ajudem a difundir esta carta. O contraditório é bom para o Teatro, para o Ensino e para o exercício da Democracia.
Apesar da frágil argumentação da ESTC em favor de uma discussão privada entre as partes envolvidas, decidimos pela carta aberta por entender que o público, ou seja, as pessoas que vão chegar ao teatro esta noite e dar com a cara na porta, que o público, parte mais interessada nesta discussão, estaria ausente no momento das explicações sobre o motivo que frustrou seus esforços em deslocar-se até a Amadora (sede da ESTC) para ver obras do teatro contemporâneo brasileiro. Por fim, encontraram um portão fechado. Aproveitamos ainda a palavra “público” para lembrar que a ESTC é uma instituição pública, donde não vemos razões para articulações de bastidores quando se trata de alg o do interesse público, como o cancelamento de um espetáculo poucas horas antes de sua realização em instalações públicas, medida que tem como maior prejudicado o público, que perdeu a oportunidade de assistir gratuitamente a duas peças teatrais representantes do novo Brasil. E, como veremos mais adiante, a discórdia que levou ao fútil cancelamento, não teve outra raiz que não a discussão sobre o público.
Antes da explicação, uma ligeira introdução para recordar aos amigos o que estamos fazendo em Lisboa:
O Ministério da Cultura do Brasil, em seu empenho por estreitar os laços culturais com seus irmãos dos mundos lusófono e hispânico, lançou em 2009 o projeto EMBAIXADA DO TEATRO BRASILEIRO, uma extensa e variada programação composta por espetáculos teatrais, cinema, workshops e seminários que tem como um de seus objetivos contar um pouco da história do moderno teatro brasileiro.
O outro e mais importante objetivo deste projeto é fazer uma “radiografia” da dramaturgia contemporânea em diversos países que falam português e espanhol, ou seja, estamos entrevistando dramaturgos, atores, diretores e críticos de todos estes países e recolhendo suas obras para levá-las ao Brasil. Pretendemos traduzir (no caso do espanhol) e ler publicamente estas obras em solo brasileiro com diversos grupos nacionais. Também queremos convidar artistas de todos os países envolvidos para participarem de montagens de várias destas obras no Brasil ao lado de artistas brasileiros. Por fim, lançaremos edições bilíngües (português e espanhol) das obras que representam a nova dramaturgia afroiberoamericana.
Já visitamos 12 países entre América Latina, Europa e África. Ainda faltam 04 países para que se encerre este ciclo. São mais de 200 horas de vídeo entre entrevistas com mais de uma centena de artistas e obras filmadas nas diversas cidades visitadas. Mais de 500 horas entre workshops, espetáculos e seminários. Some-se a isto 240 alunos das oficinas até o momento, fora os ouvintes. Ainda mais uns 5000 espectadores para os espetáculos. E para abusar do “mais”, enfim, o mais importante: TUDO GRATUITO! O Ministério da Cultura do Brasil financiou completamente este projeto para que o público dos nossos países irmãos pudesse participar deste intercâmbio sem distinções econômicas. Se todas estas ações não demonstram boa vontade e amizade da parte do Brasil, entendemos que se perdeu o significado de boa vontade e amizade.
Vale ainda ressaltar que o “Embaixador do Teatro” responsável por este projeto é nada menos que um dos atores mais importantes dos nossos palcos como podem atestar todos os livros de história sobre o moderno teatro brasileiro. Trata-se de RENATO BORGHI. Sugiro que façam uma simples pesquisa no Google para saber um pouco mais sobre a envergadura teatral deste nobre senhor com 52 anos de carreira.
Após quase um ano de viagens pelo mundo hispânico, falando somente em espanhol, qual não foi a nossa felicidade quando aportamos nestas terras da nossa doce língua. É muito sagrado para um ator falar na sua língua de origem. Para o workshop sobre Nelson Rodrigues, contamos com uma das turmas mais dedicadas que encontramos durante toda nossa odisséia. Atores de entrega comovente. De seriedade comovente. Na ESTC, fomos recebidos de início com simpatia e gentileza. As nossas produtoras locais se mostraram presentes, eficientes e atentas a todas as nossas necessidades. Tudo prenunciava um lindo céu outonal de Lisboa para o vôo da nossa EMBAIXADA.
Infelizmente, não tardou que cinzentas nuvens, velhas conhecidas e inimigas dos artistas, sombreassem a ESTC. Coisas que haviam passado despercebidas em princípio começaram a adquirir corpo: por exemplo, entre os alunos do workshop, havia quase nenhum ligado à escola; estranho sintoma no caso de uma escola de teatro que está recebendo um dos ilustres do teatro brasileiro. Mas pensamos: bem, o fim das férias de verão (fragilíssima desculpa)... E relevamos o fato (nunca é demais lembrar que alunos de férias continuam a ter seus e-mails e nem toda gente foge de Portugal. Mas enfim, deixamos passar!).
Houve também um episódio em que nos desculpamos com a direção da escola porque eles sentiram-se ofendidos ao não serem convidados oficialmente pela Embaixada do Brasil para um evento de lançamento do projeto no próprio edifíci o da Embaixada. A Embaixada do Brasil é soberana e independente de nosso projeto, é bom lembrar. De qualquer forma, solidarizamos-nos com a direção da escola, agradecemos a acolhida que nos deram, manifestamos nossa alegria por estarmos ali e os céus de Lisboa ainda pareciam azuis. É verdade que houve algumas resistências por parte da escola em flexibilizar um pouco mais os horários para que se pudesse ampliar o tempo de trabalho do workshop. Mas tudo acabou contornado ao final.
O seminário de BORGHI sobre a história do teatro brasileiro moderno correu dentro da normalidade, apesar da tímida presença dos alunos da ESTC, que foram basicamente instigados a comparecer pelos professores Eugênia Vasquez e Armando Rosa, os únicos que verdadeiramente se aproximaram de nós dentro da escola. Ainda que após um pequeno intervalo, a sala tenha se esva ziado consideravelmente, poderia se dizer que o objetivo do seminário foi cumprido a contento.
Veio então a primeira chuva sem avisar sobre nossas cabeças: nós e os 24 alunos do workshop (que não eram alunos da ESTC em sua esmagadora maioria) quase nos matamos de trabalhar para apresentar aos alunos da ESTC cenas do maior dramaturgo ...brasileiro, Nelson Rodrigues, quiçá um dos maiores da língua portuguesa, ainda relativamente pouco conhecido em Portugal se levamos em consideração sua estatura e o idioma comum. Parecia óbvio que a ESTC quando nos acolheu tinha um plano pedagógico para isto, afinal é o que se espera de uma instituição que se declara de “ensino superior”.
Pois qual foi nossa surpresa ao percebermos que não, não era óbvio: não havia nenhum plano de estudos ou de pesquisa com os alunos, sequer havia uma curiosidade qualquer no ar. Não havia praticamente nenhum aluno ou professor da ESTC para prestigiar o trabalho dos colegas brasileiros e portugueses que se esfalfaram por 05 dias para oferecer alguns singelos fragmentos do que nossa dramaturgia tem de melhor. Se não houve curiosidade sobre Nelson Rodrigues, nem falemos a respeito da curiosidade que deveria haver em uma escola de teatro sobre o trabalho de um grupo estrangeiro de importante currículo, quanto menos sobre a curiosidade pelos atores portugueses que “nem da escola eram” (discriminação explicitamente clara diante do nulo comparecimento de alunos e professores da ESTC à atividade).
Certamente, pedimos perdão aos 03 ou 04 professores ou alunos que compareceram (se é que compareceram) a esta apresentação. Mas isto não aliviou a nossa dor. E voltando ao tema público, nossa dor foi pública, o que justifica nosso desabafo público. Não me parece nada justo que nós atores fiquemos totalmente expostos ao relento d e uma sala fria e vazia e depois nos peçam para fazer as críticas em privado para poupar as falhas da escola. Fazer uma crítica em público, ainda que seja dura, é a própria essência do fenômeno teatral, além de constituir o espírito crítico das maiores escolas do mundo. Portanto, a alegação de que deveríamos fazer críticas fechados em pequenas salas protegidas do olhar público não convence e alimenta hábitos nocivos à boa saúde do teatro e de uma instituição de ensino madura. Refutamos com veemência estas práticas palacianas covardes disfarçadas de boas maneiras.
O Teatro está ligado à Ágora grega e perde seu vigor quando se afasta do conflito em praça pública. Se o teatro fosse o lugar destas “boas maneiras”, a melhor parte da dramaturgia universal nem teria surgido. Uma escola que se dedica ao ensino do fenômeno teatral não pode se esconder por detrás das “boas maneiras” para disfarçar suas fraquezas. Apegar-se a estes conceitos duvidosos de “comportamento adequado” apenas demonstra um autismo auto-indulgente que desidrata o ímpeto da criação artística. Péssimo caminho para uma escola de teatro que ambicione alguma excelência crítica.
A primeira decepção com as cenas de Nelson Rodrigues só faria introdução a outra muito maior: os dois espetáculos de dramaturgia contemporânea brasileira protagonizados por BORGHI foram solenemente ignorados pela ESTC. Não havia professores. Nem perguntemos pelos alunos: havia uns heróicos 04 ou 05, aos quais agradecemos muito. Se não fossem os fiéis alunos do nosso workshop e seus acompanhantes, mais as nossas produtoras e equipe, não contaríamos sequer com 10 pessoas no platéia de um teatro com uma capacidade imensa de público (o que amplia ainda mais o vazio).
Vocês podem imaginar o que um dos maiores atores portugueses sentiria se chegasse a uma escola de teatro brasileira para dar o seu melhor, aos 73 anos de idade e 52 de carreira e acabasse por ser humilhado desta forma? Porque foi uma humilhação pública. Apesar da perple xidade, fizemos o melhor espetáculo que pudemos em honra aos poucos, mas salvadores que vieram nos ver.
Perguntamos, amigos portugueses: é esta total ausência de articulação e mobilização que vocês esperariam encontrar numa escola de teatro? Não ficariam vocês espantados se o mesmo lhes acontecesse no Brasil. Se a ESTC não tem condições de mobilizar seus professores, quanto mais seus alunos, deveria nos ter avisado desta sua incompetência, pois jamais teríamos aceitado ir para lá. Amigos portugueses, vocês têm noção do quanto foi gasto pelo governo brasileiro para trazer uma equipe de 06 pessoas a Portugal por 15 dias arcando com todos os custos para que os lisboetas pudessem desfrutar gratuitamente um pouco do nosso teatro? Alguém pode imaginar o tamanho do desperdício humano e financeiro que se fez presente naquela sala de teatro vazia e com o cancelamento irresponsável de hoje? Vale lembrar que o Teatro sempre pode se debater com salas vazias, esta é uma realidade que nós artistas conhecemos bem. Mas este raciocínio vale para uma sala regular de teatro no centro de Lisboa. Seria um risco assumido de bom grado.
Quando aceitamos ir para a Amadora, sabíamos estar contando exclusivamente com os alunos da ESTC ou talvez, se a escola fosse bem articulada (o que definitivamente não é) poderíamos ter a presença dos vizinhos da escola. Claro que a ESTC sabia desta contingência tão bem quanto nós.. De qualquer maneira, decidir por fazer um projeto de tal importância e complexidade no espaço de uma escola na Amadora (falamos apenas pela distância do centro de Lisboa, sem nenhum preconceito em relação à cidade) foi um ato de confiança na capacidade de articulação e mobilização da ESTC. Portanto, a responsabilidade da ESTC na atração de seus professores e alunos era ainda maior, pois, caso contrário, ficaríamos quase às moscas, o que efetivamente se deu. Tudo isto não parece óbvio? Que a ESTC deveria ter se empenhado mais na mobilização interna e também na proposição de pesquisa ao s seus alunos a partir das experiências intercambiadas com os artistas de além mar? Não é isso que se espera de uma ESCOLA SUPERIOR DE TEATRO em qualquer parte do mundo? Não é o óbvio ululante, como diria Nelson Rodrigues?
Pois bem, aparentemente não foi assim que pensaram alguns dos funcionários da ESTC. Dias antes das apresentações, no primeiro dia de aulas dos alunos após as férias, ou seja, o dia perfeito para fazer uma divulgação corpo-a-corpo com os alunos, nosso mestre, RENATO BORGHI se ofereceu para dar uma palavrinha de 05 minutos com os alunos para fazer um convite pessoal às atividades. Este episódio sozinho demole completamente a frágil desculpa das férias escolares para a ausência de vida na sala teatral. BORGHI, com seus 73 anos, 52 de palco, só se deslocou para a Amadora neste dia para fazer isto! Em qualquer boa escola de teatro do mundo seria considerada uma honra contar com a breve presença de um ator tão ilustre quanto RENATO BORGHI para uma aula inaugural. Para falar só 02 minutinhos! Foi só isso que pedimos. Ele se ofereceu até para ir de classe em classe falar com os alunos. Compreenderam?! Um dos maiores atores do Brasil se oferecendo humildemente para convidar os alunos de classe em classe. E qual foi a resposta da escola? Não. Não para os 02 minutos na aula inaugural. Não para a peregrinação de classe em classe. Não, não e não.
Sequer vamos levantar aqui os argumentos da escola, pois para qualquer pessoa razoavelmente lúcida este é um caso em que se dispensam argumentos. Repetir os torpes argumentos da escola seria tripudiar sobre a precariedade humana e artística de certos setores da ESTC e não é esta nossa intenção aqui.
Chegamos então ao motivo do cancelamento de nossos espetáculos: ao final da vazia e decepcionante apresentação de quinta (com ressalva ao pequeníssimo e maravilhoso público que compareceu), nos dirigimos à platéia e dissemos o seguinte (est...á tudo gravado em vídeo para dirimir qualquer dúvida):
“Agradecemos a acolhida da ESTC, mas queremos fazer uma crítica. Esperamos que a Escola aceite”. A crítica foi dura com base no relato acima e na razão que nos dá sólida sustentação. Dissemos apenas a verdade: que era uma vergonha para aquela escola acolher artistas estrangeiros com tamanha precariedade na sua capacidade de articulação e mobilização; e que tal abandono não havia acontecido em nenhum outro país, nem nas mais pobres nações da América Latina.
Foi um choque que isto ocorresse em pleno solo europeu, berço do teatro ocidental. Expusemos nossa dor e decepção ao público porque nossa dor e decepção foram públicas. Nós é que tivemos de suportar impávidos a tristeza de uma casa vazia em pleno seio de uma escola de teatro. RENATO BORGHI partiu mais para um desabafo dolorido e com todo direito que seus 52 anos de teatro lhe permitem. Negar o direito de desabafo a um ator desta monta é negar toda a tradição do teatro, pois a causa do ator era justa. Não foi um ataque de estrelismo. De novo, pensem num importante ator português passando por isto numa escola de teatro brasileira? O que ele diria sobre o ocorrido no Brasil quando voltasse a Portugal? Certamente, não seria algo muito elogioso.
Por fim, um funcionário da ESTC manifestou-se em tom já bastante elevado, o que elevou ainda mais o tom geral. Jogou a responsabilidade nas costas dos alunos, disse que “não podiam obrigar ninguém a ir”, ou seja, rasgou princípios básicos da pedagogia segundo os quais existe um mestre, um aluno orientado por ele e um programa a ser seguido, ou seja, ensino não é improviso. Quando perguntei sobre a ausência dos professores, o funcionário não conseguiu dar explicação coerente. Após uma troca de insultos em voz alta conosco no palco quando todos dissemos algumas palavras fortes, ele baixou à platéia, foi à beira do palco e insinuou como um pequeno ditador de comédia que deixássemos a cena de maneira bastante autoritária e bizarra; obviamente não acatamos o ato de censura. O funcionário ainda foi obrigado a ouvir a crítica de algumas pessoas da platéia que se solidarizaram conosco. Por fim, desistiu de nos expulsar do palco e lhe dissemos que estávamos apenas nos expressando e que o Teatro era lugar para isto, que ele também poderia se expressar e que isto era normal e necessário ainda que pudesse ser desagradável. Terminamos por encerrar a discussão dizendo ao público que eles sabiam que a razão estava do nosso lado, ao que eles nos aplaudiram efusivamente. Depois, muitos foram ao camarim prestar sua solidariedade para com nosso protesto. E foi isto: uma crítica pública, um desabafo veemente de um ator, uma discussão acalorada, algumas palavras fortes, uma tentativa tosca de censura, um aplauso entusiástico, uma atriz portuguesa formada pela escola chorou de vergonha na platéia por reconhecer a verdade. Repito: existe o vídeo para provar que não há inverdades neste relato.
Será isto causa para o cancelamento de um espetáculo? Normalmente se cancelam apresentações diante de mortes, enfermidades, acidentes ou falta de público. Nunca vimos em todos os nossos anos de estrada um espetáculo ser cancelado por uma crítica pública a qualquer pessoa ou instituição séria que tem compromissos com o público. Ainda que publicamente e em tom muito duro, um protesto justo. Só em ditaduras é que acontecem tais atos de soberba e violência. Os dirigentes da ESTC argumentaram que “não se pode ofender a casa que nos acolheu” e que deveríamos discutir esta questão em privado. Usaram estes argumentos baratos e covardes para cancelar um espetáculo que veio do outro lado do Atlântico, horas antes dos artistas se apresentarem.
Primeiro, vamos lembrar algumas coisas básicas: a casa não é deles, é pública, o que deveria levar a uma consideração sobre as conseqüências do cancelamento para o público. Usar estes argumento pífios, passando por cima dos interesses do público, que vai dar com a cara no portão da escola depois de 30 minutos de comboio é, para dizer o mínimo, patético, pois diz o bom senso que este tipo de argumentação vitimista deve ser usado com extrema moderação até nos casos mais pessoais. Em casos onde o interesse público está envolvido, só demagogos têm coragem para usar este tipo de retórica infantil. Nós também poderíamos dizer: “não se recebe um convidado para jantar com uma sopa de pedras”. E daí?! Não se trata de um concurso de frases feitas dos almanaques de outrora. Este tipo de retórica não é digna nem de passar à frente dos portões de qualquer universidade que se preze.
Lamentamos profundamente que isto tenha acontecido em Portugal, justamente a terra de uma das primeiras universidades da Europa. E dentro de uma faculdade. Quando chamam crítica de ofensa e se lixam para o interesse público, os dirigentes d...a ESTC responsáveis pela decisão do cancelamento do espetáculo só confirmam a justiça de nosso protesto contra a hipocrisia, burocracia, arrogância, ignorância, despreparo e anemia demonstrados por alguns setores desta escola neste episódio. Esperamos que os professores e funcionários que não partilham da visão obscurantista e “naif” da ESTC neste caso, tenham a sabedoria de não tomar estas palavras para si.
Deviam aceitar a crítica para melhorar. Admitir as falhas. Mas não o farão. A mediocridade intrínseca subjacente a esta situação nos faz prever reações de repúdio e negação por parte da ESTC. Pior para o ensino superior. Pior para o Teatro. Pior para os alunos. Pior para Lisboa. Pior para Portugal.
Banir, expulsar, cancelar, defender a honra da instituição, tudo isto lembra tempos obscuros e tem cheiro de carne medieval queimada. Não se aprendeu nada com episódios como o de Saramago? Ou com a saída magoada de Augusto Boal do país? Ou com o expurgo de José Celso e sua companhia das terras portuguesas? Agora é mais um importante artista brasileiro que se vai de sua amada Lisboa levando uma decepção desnecessária. Será que os “outros” é que estão sempre errados? Para quê tanto orgulho? Por que a ESTC opta pela defesa do atraso?
Durante a ditadura no Brasil também era proibido fazer críticas públicas ao próprio país. Os militares diziam que era uma vergonha falar mal do próprio país que os alimenta. Diziam que os críticos do país eram mal-agradecidos, antipatrióticos e traidores. Fossem os críticos brasileiros ou estrangeiros. Esta sempre foi a grande desculpa das ditaduras para enfiar a censura goela abaixo dos cidadãos: a defesa da pátria.
E não nos venham depois dizer que o incidente do cancelamento partiu de indivíduos que foram desrespeitados. Não teria cabimento. Quando vítimas são indivíduos e quando carrascos e juízes se portam como instituição? Façam-nos um favor!
Ficamos chocados com o fato de ter passado uma noite entre o incidente e a decisão do cancelamento e mesmo assim não haver um ato de reflexão adulto por parte da ESTC. Dói pensar que os responsáveis pela decisão sejam tão ingênuos que não tenham pensado que um ato de censura desta magnitude tem suas conseqüências, além dos óbvios paralelos com regimes totalitários. Não perceberam os tais dirigentes a cara facista que a ESTC mostrou ao mundo ao rechaçar uma companhia estrangeira de suas instalações por motivos duvidosos como a defesa da instituição? Que perigo corria a instituição? Por acaso íamos explodir uma bomba no teatro? Por que nos tornamos uma ameaça à ESTC só por expor publicamente nossas divergências? Por que a “honra” da faculdade não pode ser atingida publicamente por uma dura crítica? A ESTC é absoluta, por acaso? É sagrada? É escola superior ou igreja?
Não há aulas de história na ESTC?
Mas como dizia Brecht: “A verdade é filha do tempo e não da autoridade”. Então, podem espernear, que nem por isso a razão deixará de estar do nosso lado.
Queremos que os amigos portugueses saibam que esta estória infeliz não muda nada do nosso amor por Lisboa, por Portugal , pelos portugueses, pela língua e pelo Teatro. Pelo contrário, o amor sai fortalecido quando se enfia o dedo no olho da mentira. Levaremos daqui muitos textos portugueses de dramaturgos contemporâneos e esperamos divulgá-los, montá-los e publicá-los para sua circulação por todo universo afroiberoamericano a partir de 2011/2012.
Aproveitamos para convidar a todos os amigos portugueses para que venham se despedir de nós este sábado, dia 02, na Cinemateca de Lisboa com o filme O REI DA VELA, às 21hs. Um clássico da nossa dramaturgia protagonizado por RENATO BORGHI. Por favor, venham demonstrar a doce sensibilidade portuguesa para com este nosso querido ator. Sensibilidade que passou longe da ESTC quando viram o sofrimento deste grande artista e, em vez de retribuir com carinho, paciência e compreensão pela dificuldade enfrentada, pela história deste senhor, pelo suor dos atores, eles da ESTC se fecharam numa concha de vícios e como dizemos no Brasil: vestiram a carapuça! Não deve ser à toa que o tal funcionário “ofendido e vilipendiado” em nome da ESTC pelos “selvagens brasileiros” era o encarregado de comunicação da escola ...É preciso dizer mais alguma coisa? Quando perguntado sobre o que tinha feito para difundir o projeto na ESTC, o tal funcionário respondeu: “Facebook e site da escola”. Ou seja, viemos para uma ESCOLA SUPERIOR DE TEATRO para receber o plano pedagógico e de divulgação de uma criança de 10 anos. É preciso dizer mais alguma coisa? Não.
EQUIPE DO PROJETO EMBAIXADA DO TEATRO BRASILEIRO
(Texto retirado dum post de Miguel Castro Caldas no Facebook)
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Perante factos não há argumentos… Fico envergonhado por tal ocorrência. Por favor não meçam o todo pela parte, triste e infeliz parte…
ResponderEliminarJosé António Ferreira